terça-feira, julho 30, 2013

De volta para casa



Quando eu era adolescente e tinha um problema eu fazia um pequeno ritual. Eu me trancava no quarto, mergulhava debaixo das cobertas, me virava para as paredes e dizia: Eu quero voltar para casa, eu quero voltar para casa, eu quero voltar para casa.
Um dia eu me perguntei por que eu repetia esta frase se eu já estava em casa. Na época eu não sabia a resposta, mas hoje eu sei. A minha casa tem mais haver com meus sentimentos do que com as quatro paredes que me abrigam.

Minha casa não pode ser financiada pela CAIXA. A minha casa nunca passou de um sentimento.

Estou em casa quando eu posso tirar os sapatos. Estou em casa quando eu posso chorar sem me preocupar com a opinião alheia. Estou em casa quando eu posso conversar com alguém não sobre as minhas qualidades, mas sobre as minhas fragilidades. Estou em casa quando eu posso dizer a verdade, mesmo que ela lhe doa, mesmo que ela me doa. Estou em casa quando eu posso rir desesperadamente e sem freios. Estou em casa quando eu posso falar sem abaixar ou aumentar o tom. Estou em casa quando eu não preciso me preocupar, apenas ser.

Existem pessoas, coisas, objetos que me teleportam imediatamente para casa. Me sinto em casa quando leio: Pessoa, Lispector, Caio, Quintana, Carpinejar, Neruda, Tolkien, J.K Rowling. Me sinto em casa quando ouço: Legião, Nirvana, Engenheiros, Enya. Estou em casa quando sinto o cheiro de café, de pimenta moída na hora, de incenso, de manjericão. Estou em casa quando vejo o céu, pela fresta da janela.
Mas há dias, em que a sensação de lar desaparece e tudo que sobra são as ruas dos sentimentos. São dias difíceis em que eu tento me equilibrar em saltos, em que vivo policiando as minhas palavras para que elas não machuquem ninguém, nem mesmo a mim. São nestes dias em que eu tento agradar o mundo, mas esqueço de me agradar.

Tudo volta à vida quando eu me lembro de guardar um espaço para mim, para as coisas que eu gosto. Guardar um tempo para tomar um sorvete, guardar um tempo para ler um livro, guardar um tempo, para ficar mais tempo na cama, guardar um tempo para ver TV com meu filho, guardar um tempo para viver.

Nos últimos anos, o meu maior desejo, não é comprar uma casa na praia. Embora, não me oponha a ideia. Tudo que eu mais quero é morar dentro de mim mesma. Morar na minha respiração, no meu pulso. Saber todas as sensações que guarda a ponta dos meus dedos dos pés. Decifrar os mistérios das veias azuis que brotam sobre a minha pele.

Muitos homens e mulheres juntaram seus pertences em uma mala e ganharam mundo ansiando voltar para casa. Ixtlan, Santiago, Índia são só alguns dos caminhos mais conhecidos. No fim, descobriram que o destino que queriam chegar eram eles mesmos, descobriram-se CASAS.

Ao contrário destes homens que fizeram as malas para se descobrirem. Eu espalho as minhas roupas no armário. Ando pela cidade que sempre morei e descubro uma novidade a cada novo passo. A cada dia estou mais perto de casa e agora falta muito pouco para que eu possa finalmente dizer: Sou aquela que carrega a casa no peito.



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