quinta-feira, agosto 04, 2011

De olhos fechados ou Minha Experiência Vipassana.


Acabei de voltar de dez dias de um retiro de meditação Vipassana. Foram dez dias sem falar, sem matar (nem para comer), sem roubar, sem mentir, sem nenhum um tipo de contato físico, sem nenhum tipo de droga (nem remédio), sem ler ou escrever, sem maquiagem ou qualquer enfeite, além de passar mais de doze horas por dias meditando. Nas minhas costas meus amigos fizeram uma aposta e só uma pessoa acreditou que eu ficaria os dez dias.  Às vezes é bom saber que seus amigos acreditam em você. Tudo bem foi difícil mesmo, o que me leva a concluir que Vipassana é igual casamento tem dia em que você faz as malas para ir embora e tem dia em que ótimo, nunca é uma coisa só.
Durante 10 dias eu vivi na contra mão do mundo. Enquanto o mundo diz para você ficar de olhos bem abertos eu passei boa parte dos dias de olhos fechados, ou seja, dormindo ou meditando. Enquanto o mundo diz para você agir eu apenas observei.  Sentia-me criando uma nova lei da física.  Na física cada ação tem uma reação. Na meditação Vipassana cada sensação no corpo tem uma observação e não uma ação. O objetivo não era agir e sim me observar.  E me observar tão de perto me fez chegar a conclusões importantes sobre a vida. Eu já fiz um milhão de conclusões antes, mas o que torna essas observações especiais foi o fato de que dessa vez eu senti essas conclusões na pele, nos ossos, nos músculos, na respiração. E sentir isso fez toda a diferença.
Nestes dias eu obedeci ao chamado nobre silêncio, ou seja, não falar. Só era permitido falar com o gerente sobre assuntos operacionais. Quando no quarto dia eu perguntei para a gerente: Cadê a pá? A minha voz pareceu rouca e estranha. Me perguntei dez, quinze, vinte mil vezes se falar era realmente necessário. E cheguei à conclusão que falar na maioria das vezes trás muito mais problemas do que soluções. Secretamente eu fazia planos de uma profissão em que eu precisasse falar menos. Será que alguém me contrata para trabalhar com pesquisas e escrever? No último dia em que finalmente falar era permitido descobri que falar cansa e descobri que havia quebrado o voto de silêncio sem querer: Eu falo dormindo. O mais interessante de tudo isso é que depois que as vozes se calam é possível ouvir todos os sons do mundo. Os passos das pessoas, o barulho do relógio, o barulho da água que sai do filtro, o barulho da mastigação, a respiração das pessoas.  Fiquei em duvida se estes sons estavam lá antes. Agora a conclusão mais importante desses dez dias: Calar a boca é fichinha o difícil mesmo é calar a mente. Levei quatro dias para conseguir prestar atenção concentrada na minha respiração por mais de cinco minutos. A minha mente é mais conversadora do que a minha turma de quarta-feira. Podem acreditar em mim quando eu falo que essa turma é realmente conversadora.  E a segunda conclusão mais importante do retiro: Não mentir fica fácil quando não se precisa conversar.
O que mais me assustou quando eu fui para o retiro foi saber que eu teria que ficar parada na mesma posição o máximo de tempo possível e durante três horas por dia eu teria que ficar ou tentar ficar totalmente imóvel suportando as dores. Elizabeth Gilbert no seu livro Comer, Rezar e Amar define a meditação Vipassana como: A versão esportes radicais da transcendência. Eu não deixo de concordar com ela, não que eu tenha feito muita coisa radical na minha vida, mas parar dez dias em silêncio foi à coisa mais radical que eu fiz na vida.  Sem duvida uma das mais complicadas e difíceis até então, suportar a realidade assim como ela é.
Depois eu descobri por que ficar parado doía tanto. Por que como disse Lulu Santos: Tudo passa tudo sempre passará. A vida é assim como o Google cada dia aparece com uma novidade se insistimos em só usar os recursos antigos, estamos no mínimo perdendo tempo.  A última novidade que vi é que você pode fazer chamadas pelo gmail. Essa eu vi hoje.  Quando paramos em uma situação ou em um momento acabamos tentando controlar uma situação ou a própria vida. E a vida e as coisas não são o tempo todo como a gente quer, são como são. Quando se está preparado para lidar com as mudanças, com a frustração, com a dor, com o medo, com os assuntos mal resolvidos. Quando você diz: Eu posso até não conseguir, mas eu vou ficar aqui o tempo que precisar eu vou tentar com todas as minhas forças. E quando nós conhecemos e confiamos na gente mesmo, na vida.  Quando você não tem mais nenhuma para desculpa para oferecer, nos resta aceitar que o passado passou e que a vida continua.  Bom, as coisas acontecem. È dificil, mas dá certo. Eu sei essa filosofia é batida, mas eu nunca tinha entendido isso tão bem.
No primeiro dia que eu cheguei ao retiro eu ganhei quatro azulejos verdes, esse era o meu espaço.  Sem trocadilhos lá era cada um no seu quadrado, não se podia invadir o espaço do outro. Contudo havia uma briga silenciosa e sutil pelo espaço. Em determinado momento eu me toquei que a senhora que estava atrás de mim e que eu já conhecia de Paraúna (momento de terapia intensiva) e havia feito a dinâmica do espaço.  Nessa dinâmica uma pessoa te segura e você pede ou grita pelo espaço e a pessoa te diz não repetidas vezes, até que a pessoa enfim te solta e te dá seu tão desejado espaço. Eu chorei ao me lembrar dela dizendo e me abraçando: Tome seu espaço, minha filha. Use-o da melhor forma. Ele é todo seu, não vou impedi-la mais. E de repente eu tinha o consentimento de todas as pessoas que um dia eu senti que me prenderam na vida. Enfim, eu posso e vou usar o meu espaço.
Lá eu aprendi várias coisas: Aprendi a dormir sentada, aprendi a magia das cores tamanha era a quantidade de lenços coloridos, lá eu aprendi que com paciência e constância é possível progredir. Lá eu vi a solidariedade de pessoas desconhecidas. Lá eu vi que crescer é uma possibilidade.  Outra coisa que vi lá é que as experiências são sempre diferentes por isso estou colocando aqui o link da reportagem de Eliane Brum intitulada: O meu inimigo sou eu que narra a experiência dela em um retiro de meditação Vipassana.
 

7 comentários:

  1. Pelo visto você tá sem tempo já faz 1 mês! =(

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  2. que lindo! vc pratica a med. em GOiania? estou procurando um grupo.
    namastê

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  3. Grazi,

    Então, não sabia onde responder estou postando um comentário aqui mesmo. Eu prático meditação vipassana aqui em goiânia.Estou tentando montar um grupo semanal de meditação vipassana. Você já fez o curso de dez dias de meditação vipassana?

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    1. Oi, tudo bem? Sou de Goiânia e tenho interesse em participar de um grupo de meditação vipassana. Você tem alguma informação? Obrigada.

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  4. Oi Débora, vou fazer uma pergunta que pode parecer besteira, mas me inscrevi para o curso Vipassana este mês e estou com alguns medos. Fico pensando se quando voltar vou continuar querendo sair com os amigos, me divertir, namorar, enfim, este tipo de coisa. Sei que não é possível mudar tanto em dez dias, mas fico pensando que posso querer me isolar e ter interesses diferentes dos que eu tenho agora....isso faz sentido? Um abraço.

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  5. Oi Agusta. Não sabia onde te responder acabei fazendo um post novo.Só acompanhar o link:

    http://www.donaparanoia.blogspot.com/2012/01/resposta-sobre-o-curso-de-meditacao.html

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  6. Carol, bom dia. Para participar de um grupo de meditação Vipassana é preciso ter feito um curso de 10 dias. Esse curso é oferecido em um local de meditação, mas infelizmente não temos nenhum local específico para essa prática em Goiânia.

    Eu fiz esse curso em Brasília. Nesse endereço você encontra mais informações sobre o curso. http://courses.dhamma.org/pt-BR/schedules/noncenter/planalto-central.br. Sei que tem alguns alunos antigos que organizam pequenos retiros de meditação em Pirenópolis. http://contatosespacoazul.blogspot.com.br/

    Qualquer dúvida é só enviar um e-mail para dfaramos@gmail.com que eu posso lhe esclarecer algumas dúvidas.

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